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domingo, 27 de março de 2011

Gravidez por agressão sexual: quando o aborto é uma opção


Não bastasse a criança ou a adolescente ter passado pelo trauma da agressão sexual, em muitos casos, tem de enfrentar um drama ainda maior – a possibilidade de gerar um filho do agressor. Além dos sinais de agressão física, ficam marcas ainda mais profundas, misturando angústia, depressão e dúvidas em relação ao futuro. Quando casos assim chegam aos hospitais, a gravidez pode ser interrompida com um anticoncepcional de emergência até o quinto dia.
Passado este tempo, no entanto, as opções para a menina tornam-se ainda mais complicadas. Ela pode seguir com a gestação e ficar com a criança após o parto, o que é uma decisão muito difícil em vista da agressão sofrida; doar a criança para adoção após o parto ou interromper a gravidez.
O aborto é permito nos casos de gestação decorrente de violência sexual, segundo o artigo 128, do Decreto Lei 2848, do Código Penal.
É um momento muito delicado, onde a menina precisa receber atenção médica, social e emocional de todos os profissionais e responsáveis envolvidos. O médico verifica se o tempo de gestação corresponde ao do ato de agressão sexual. Avalia o estado de saúde da paciente, realiza os exames e trâmites pré-operatórios e, por fim, executa o procedimento mais adequado para interromper a gestação com o máximo de segurança.
O papel do profissional do serviço social é fundamental neste processo, porque é quem primeiro ouve a história da gestante com todos os seus pormenores que serão relatados por escrito, de forma que a vítima não precise contar e recontar o caso toda vez que for atendida. Este depoimento é importante para saber o que a criança ou o adolescente está sentindo. Tudo é registrado e servirá como documento para o Poder Judiciário. A assistente social também é responsável por preparar os processos internos administrativos, verificar se a paciente tem ou não quem a acompanhe e se o crime já foi devidamente notificado às autoridades competentes.
Ao psicólogo cabe descobrir se a paciente está sendo apoiada por algum familiar ou amigo, qual o peso de um aborto em sua vida, se o ato vai contrariar sua religião ou valores e descobrir se a menina sofre de problemas emocionais, como depressão. “Em uma situação grave como essa, ter o apoio de uma equipe multidisciplinar trabalhando de forma integrada é o mínimo que uma menina deve receber”, conta Dr. Jéferson Drezett, diretor técnico do serviço de saúde do Núcleo de Programas Especiais do Serviço de Atenção Integral à Mulher em Situação de Violência Sexual do Centro de Referência da Saúde da Mulher do Hospital Pérola Byington.


Para que o procedimento do aborto seja concretizado, é necessária a aprovação por parte de todos os profissionais da equipe multidisciplinar envolvida e que sejam cumpridas as regras administrativas, pelas quais cinco documentos assinados são exigidos:
1. Termo de relato circunstanciado, no qual o representante legal da menina relata de próprio punho o ocorrido.
2. Parecer técnico, em que pelo menos um médico assuma a responsabilidade técnica, confirmando que a gravidez é decorrente da agressão sexual sofrida.
3. Termo de responsabilidade, no qual o representante legal se diz ciente de que aborto é crime e que mentir em circunstâncias como essa caracteriza crime de falsidade ideológica.
4. Termo de aprovação pela equipe multidisciplinar, em sua integralidade.
5. Termo de consentimento livre esclarecido, no qual o responsável legal solicita e autoriza o aborto.

Dr. Jeferson também frisa que o aborto, mesmo permitido por lei em casos de agressão sexual, ainda é um tema tabu para muitos profissionais, por isso, só trabalham neste procedimento os médicos e anestesistas que lidam bem com o tema, sem problemas emocionais

Aborto ilegal mata uma mulher a cada dois dias .

MORTE EM SILÊNCIO
SÃO PAULO - Enquanto religião e política se misturam na campanha presidencial, reportagem de O GLOBO deste domingo revela que uma mulher aborta a cada 33 segundos e a prática insegura mata uma brasileira a cada dois dias, sendo que um abortamento é feito para cada 3,5 nascidos vivos. Tema polêmico, desde que o aborto passou a ser assunto central da campanha, sendo responsável, segundo pesquisas, por ajudar a levar a eleição para o segundo turno, os candidatos Dilma Rousseff (PT) e José Serra (PSDB) têm se esforçado para manter a discussão vinculada ao viés moral e religioso.
- O debate não devia tratar de quem é contra e quem é a favor, mas de como é possível resolver um problema de saúde pública. Mulheres de todas as classes sociais, idades, escolaridades e religiões abortam. Muitas acabam no serviço público de saúde, onde são negligenciadas, julgadas e condenadas, o que contribui para que o número de mortes seja alto - diz Paula Viana, do grupo Curumim, que pesquisou a questão em cinco estados: Rio de Janeiro, Paraíba, Mato Grosso do Sul, Bahia e Pernambuco.
De acordo com dados do Sistema Único de Saúde (SUS), 183,6 mil atendimentos de mulheres que abortaram, sofreram complicações e precisaram passar por uma curetagem foram feitos em 2009. Segundo as estimativas dos médicos, para cada caso que acaba no hospital, outros quatro abortos foram feitos no mais absoluto silêncio. Só em 2009, 942.713 abortamentos induzidos foram realizados no país. A conta, feita pelo pesquisador Mario Monteiro, da Uerj, a partir de dados do SUS, não leva em conta os abortos espontâneos e as mulheres que abortaram em clínicas particulares ou em casa e não precisaram recorrer ao sistema público.

Mulher pode ser condenada à prisão
Feito às escuras e das mais variadas formas - desde o uso de medicamentos, chás e até com objetos perfurantes -, o aborto é, de acordo com o Ministério da Saúde, responsável por 15% das mortes maternas, sendo a quarta causa de mortalidade de mães no Brasil. Em média, 200 brasileiras morrem por ano. Os únicos tipos permitidos são o "humanitário" (quando a mulher sofre violência sexual) e o "terapêutico" (para mulheres em risco de vida). O aborto em caso de anencefalia (o bebê, se nascer, não terá cérebro) ainda é polêmico no Supremo Tribunal Federal (STF). Para os outros casos, a mulher que abortar pode ser condenada a até três anos de prisão.
- A criminalização faz com que seja difícil termos informações sobre abortos, mas não impede que as mulheres interrompam a gravidez. Em Salvador, no começo e no final dos anos 90, o aborto era a primeira causa de morte materna. O mesmo aconteceu em Recife, no começo da década de 90, e em Porto Alegre no ano 2000. A partir dos dados disponíveis, não é exagero reiterar que temos um problema de saúde pública - diz a médica Greice Menezes, do Instituto de Saúde Coletiva da UFRJ.

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