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domingo, 27 de março de 2011

Acuados no trabalho





Aumentam na Justiça brasileira os casos de assédio moral horizontal, quando quem humilha, agride e isola são os próprios colegas e não os chefes

"Em 25 anos de carreira, nunca tive sequer um desentendimento no ambiente de trabalho. Há cerca de dois meses, porém, comecei a receber e-mails anônimos me desqualificando como profissional e me ofendendo pessoalmente. O meu agressor me chama de pseudoprofissional, me pergunta quando vou deixar de enrolar e começar a trabalhar e usa palavras de baixo calão. Se dá ao trabalho de mandar essas mensagens até de madrugada. Gerencio uma equipe e sei que ninguém morre de amores por seu chefe, mas acho improvável que seja algum subordinado. Parece mais coisa de outro gerente, até pelo tipo de ataque. Ainda não falei com ninguém da empresa, mas já consultei uma advogada. Se a perseguição continuar, vou fazer um boletim de ocorrência e abrir um processo para pedir que o gerenciador de e-mails me passe os dados do dono dessa conta.”
O depoimento do gerente de TI A.M, 44 anos, de São Paulo, ilustra uma prática cada vez mais comum no ambiente profissional. Humilhar, ridicularizar e isolar pessoas deixou de ser uma exclusividade hierárquica, de superiores truculentos, ignorantes ou tiranos. Agora, colegas também se espezinham e se torturam, protegidos por divisórias, contas anônimas de e-mails ou até pela política da maioria das empresas, que fazem vista grossa para casos evidentes de assédio moral horizontal – como se convencionou chamar esse tipo de agressão entre iguais. “A prática cresceu muito nos últimos cinco anos”, confirma a médica Margarida Barreto, uma das maiores especialistas do assunto no Brasil, que organizou a Conferência Internacional sobre Assédio Moral, no Rio de Janeiro. Prova do aumento de casos é a audiência do site Assédio Moral (www.assediomoral.org), criado por Margarida em 2000. No primeiro ano, a página recebia no máximo dois depoimentos de vítimas por mês. Hoje, são 20 por dia.
Como nos casos clássicos de assédio moral, em que o chefe é o algoz do subordinado, esse tipo de psicoterrorismo, também chamado de bullying no trabalho, afeta emocionalmente o trabalhador, compromete a produtividade da empresa e, em última instância, desemboca em processos judiciais e pedidos milionários de indenização. O ambiente corporativo cada vez mais competitivo e a cultura empresarial, que vê o funcionário como gasto em vez de investimento, contribuem para a fabricação em série de torturadores profissionais. Metas inalcançáveis, prazos exíguos, prêmios e castigos criam uma atmosfera inóspita falta de respeito ao ser humano. Mas, apesar de a competitividade funcionar como fermento para índoles frágeis, o funcionalismo público, em que a garantia da estabilidade neutraliza a necessidade de ser melhor que os outros para manter o emprego, também tem se mostrado profícuo de casos. Como o da servidora Tatiana Araújo Jorge, 48 anos, de Brasília. Há 31 anos no Congresso, e em contagem regressiva para se aposentar, ela passou a ser vítima de assédio no trabalho. Tudo porque aderiu a uma chapa contrária à do diretor no sindicato. “Passei a ser perseguida por ele e por colegas que o idolatram e fazem parte do grupo político dele”, conta. Além de ouvir piadinhas, quando chegava ao trabalho Tatiana encontrava invariavelmente sobre sua mesa algum material político do grupo adversário – um folheto, um boné, uma camisa, etc. Ao reclamar, todos alegavam estar apenas brincando. Não estavam. As duas chapas perderam a eleição, mas a perseguição continuou e ela se viu obrigada a pedir transferência. “Foi uma das piores fases da minha vida, de uma violência enorme”, diz.
Como na história de Tatiana, uma das questões mais nebulosas nos casos de assédio entre colegas é perceber o ponto em que uma brincadeira ganha ares de coisa séria. Regra geral, afirmam os especialistas, a piada deixa de ser uma gracinha corporativa quando se repete diariamente e passa a ser pejorativa. “A grande maioria das vítimas nem se dá conta de que está passando por isso”, concluiu a psicóloga gaúcha Mayte Raya Amazarrai, que defendeu uma tese de doutorado na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) sobre o bullying entre bancários, uma das categorias mais afetadas pelo problema. Mayte entrevistou 600 profissionais em duas etapas. Em um primeiro momento, apresentou várias situações típicas de assédio e perguntou se a pessoa passava por aquilo com frequência. Em seguida, questionou: você é vítima de assédio moral? Um terço afirmou passar por situações de assédio semanalmente. Mas só 7% afirmaram que sofriam assédio moral de fato. “Isso comprova que eles acham que as perseguições e humilhações fazem parte do jogo e que, se não se submeterem, serão vistos como fracos ou maus profissionais”, explica a pesquisadora.
A psicóloga carioca Luciene Lacerda, que coordena um projeto de combate ao assédio moral na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), fez um estudo com funcionários da área da saúde do Rio de Janeiro e também detectou um considerável número de reclamações de assédio moral horizontal. “Se isso acontece entre colegas é porque há espaço, seja dado pelo chefe, seja por causa da cultura da empresa”, afirma. Foi o que se deu com a enfermeira Naiara Dias Pereira França, 35 anos, de Patrocínio (MG). Primeiro, o dono do hospital em que ela trabalhava a assediou sexualmente. Depois, moralmente. Aí seus colegas se viram no direito de acuá-la também. O bullying começou com piadas relacionadas à cor da pele da enfermeira, que é negra. Ela reagiu e deu queixa na polícia. Em seguida, vieram os boatos de que ela não era boa mãe nem esposa e que traía o marido. “Fora que diziam que eu é que tinha dado a chance para meu ex-patrão me cantar, usando a velha máxima machista.” A situação se arrastou até que a enfermeira foi demitida e entrou com um processo de assédio moral. “Vou até o fim com isso”, diz. “Perdi o sono, o emprego, até o marido. Mas não perdi minha dignidade.”
O assédio moral, vertical ou horizontal, não tem legislação específica – os casos são julgados com base no princípio da dignidade humana, que está na Constituição. Pelo menos nove projetos de lei tramitam no Congresso com esse objetivo. A Justiça do Trabalho, encarregada de julgar casos de assédio desde 2004, não contabiliza processos específicos de assédio moral. Mas juízes, procuradores e advogados são unânimes em apontar o visível aumento. “Os casos crescem em progressão geométrica”, afirma o vice-presidente do Tribunal Superios do Trabalho, ministro João Oreste Dalazen. Embora a grande maioria se resolva nas Superintendências Regionais do Trabalho em acordos entre as partes, os especialistas preveem um congestionamento de ações nas varas.
O assédio moral horizontal também ganha território no meio digital. Troca de acusações por e-mail e reclamações nas redes sociais têm se tornado cada vez mais comuns. O grande perigo da internet é que ela encoraja os agressores mais tímidos. “As pessoas se sentem mais à vontade atrás de um teclado, porque os meios eletrônicos quebram a timidez. Mas esquecem que, dessa forma, estão deixando rastros, que são aceitos como provas pelo Judiciário”, afirma o advogado especializado em direito digital Renato Opice Blum. Segundo a advogada Patrícia Peck Pinheiro, um confronto de gerações está gerando uma situação curiosa nos casos de assédio moral. “A geração Y (até 30 anos) se acostumou a desabafar e fazer justiça via Twitter, enquanto a geração X (acima de 30) é mais adepta da reclamação no cafezinho”, constata. O perigo, segundo ela, é que uma pessoa que está sendo assediada passe de vítima a culpada ao desabafar na internet. Ela começa com um “odeio meu chefe” ou “meu colega é um idiota” e, quando se dá conta, pode ser processada por tê-los difamado. “Por isso, sempre brinco que os fins não justificam os e-mails.”
Muito antes de chegar à Justiça, as vítimas de assédio moral enfrentam uma romaria de adversidades. A primeira delas é o aparecimento de distúrbios físicos e psicológicos. O sofrimento gerado pela agressão causa desde crises de choro e insônia até pensamentos suicidas. Vítima do assédio de seus colegas, a bancária Cassandra Martins, 32 anos, de São Paulo, tem seguidas crises de ansiedade e engordou 12 quilos. Ela adquiriu uma doença nas cordas vocais quando trabalhava no telemarketing da instituição financeira, que a faz tirar seguidas licenças médicas. Sempre que volta de uma delas, é a mesma ladainha: “Estava de férias?”, “Que vida boa, hein?” ou “Adoraria ter sua doença para ficar recebendo sem trabalhar”. Atualmente afastada, Cassandra não vê a hora de voltar à ativa. “Não aguento mais ficar em casa, preciso sustentar meu filho”, diz. Segundo o psicólogo especialista em relações humanas Dirceu Moreira, autor do livro “Transtorno do Assédio Moral. Bullying – a Violência Silenciosa” (WAK Editora), quando chega ao seu consultório, a vítima de assédio já está em depressão. “Ela se sente incapaz e não vê mais sentido na vida”, diz.
Diante do aumento de casos, algumas empresas começam a se mobilizar para evitar o problema, afirma a consultora em recursos humanos Maria Inês Fellipe. Palestras de prevenção e cursos de formação de líderes estão entre as estratégias. “Tudo é muito tímido, no entanto”, diz Maria Inês. “A grande maioria das empresas ataca as consequências e não a causa do assédio”, diz. “Se está todo mundo estressado, por exemplo, um curso de massagem não resolve a questão.” Magnus Ribas Apostólico, diretor da Associação Brasileira de Recursos Humanos (ABRH), concorda que se antecipar é o melhor caminho. “O concorrente está fora da empresa, não dentro”, lembra. A analista financeira Gabriela Marcondes, 25 anos, de São Paulo, aprendeu essa lição de maneira traumática. Recém-formada, ela foi assediada pela pessoa que iria substituir. Magoada, a funcionária demitida fez com que toda a equipe ignorasse Gabriela, a ponto de ela ter de voltar para casa na hora do almoço por não ter companhia. “Parecia coisa de colégio”, lembra. “Acho que isso só aconteceu comigo porque meu chefe não soube gerir a troca de funcionários.”
Em meio ao terreno pantanoso no qual o assédio moral se desenrola, fica a dica às vítimas: procure ajuda psicológica em primeiro lugar. “Se a pessoa consegue voltar a enxergar a própria competência, ela perde o medo, recupera a autoestima e consegue se impor”, ressalta Moreira. Se ainda assim as humilhações persistirem, anote todos os detalhes sobre as agressões –, datas, dias, horários, setores e até possíveis testemunhas – caso a história mereça ser levada aos tribunais.

Ciberbullying: o que fazer quando seu filho é o agressor?


A garotada sabe tudo sobre internet. E quase nada sobre respeito
Antes de tudo, peço desculpas pelo palavrão cheio de consoantes que você acaba de ler. Ciberbullying é um termo esquisito. Soa aos meus ouvidos como um pedregulho, como uma agulha desgastada que arranha um disco de vinil. Quem nasceu depois dos anos 90 talvez nunca tenha visto um desses bolachões, mas certamente sabe o que é ciberbullying. A palavra, em inglês, foi importada e rapidamente incorporada ao nosso vocabulário assim como a maioria dos hábitos e ferramentas que a internet instituiu.
Sob vários aspectos, a internet mudou nossa vida para melhor. Sabe-se, porém, que também trouxe problemas. Um deles foi ter amplificado o poder devastador do bullying, um tipo odioso de violência escolar. O bullying ocorre quando o agressor é mais forte ou mais poderoso que a vítima. É praticado por quem insiste em humilhar, subjugar, agredir o colega, isolá-lo do grupo. Quem já passou por isso sabe que as consequências podem ser duradouras. Podem surgir sintomas físicos, doenças psicossomáticas, problemas emocionais, sociais e de aprendizagem.
O bullying no meio digital (ou ciberbullying) tornou-se uma grande preocupação dos pais que têm filhos em idade escolar. Li um interessante estudo publicado em julho na revista científica Archives of General Psychiatry. Um resumo do artigo você encontra neste link. O trabalho menciona uma estatística sobre ciberbullying entre estudantes de 10 a 17 anos nos Estados Unidos. Nessa amostra, 12% declararam ter agredido alguém pela internet; 4% disseram ter sido alvo de agressão e 3% revelaram ter estado nas duas posições. Ou seja: em algumas vezes foi o agressor. Em outras, o agredido.
Todos nós tentamos proteger nossas crianças dessa ameaça. E se o seu filho estiver do outro lado? E se você descobrir que, em vez de vítima, ele é o agressor? A probabilidade de ter em casa uma criança ou jovem que pratica ciberbullying não é baixa. Dependendo da idade da criança, ela nem entende direito a extensão dos danos provocados pelas agressões. Mas agridem. Recentemente ouvi duas histórias que chamaram minha atenção para o desafio que os pais e as escolas enfrentam.
Três meninas de 10 anos se encontraram na frente de um computador e decidiram dizer tudo o que pensavam sobre uma coleguinha de classe. Bancaram as "supersinceras". Escreveram coisas do tipo: "você é chata", "você acha que tudo tem de ser do seu jeito", “nunca mais quero ser sua amiga” etc. Dá para imaginar a confusão que isso provocou, né?
Os pais da menina agredida reclamaram. Os pais das agressoras ficaram arrasados, se perguntando onde erraram na educação das filhas. Por sorte, os casais são amigos e puderam conduzir a história com maturidade. Procuraram mostrar às crianças o quanto elas sofreriam se estivessem na posição da menina agredida. E o quanto esse tipo de constrangimento é odioso. Tentaram mostrar, também, que não podemos dizer pela internet aquilo que não temos coragem de expressar pessoalmente.
As agressoras choraram. De vergonha e arrependimento. Demonstraram, sinceramente, não ter noção dos danos que estavam provocando. Achavam que, se fossem francas com a amiga, ela perceberia que precisava mudar seu comportamento.
Superada a crise (pelo menos aparentemente), as quatro continuam amigas. Passam as tardes juntas na escola, dormem na casa de uma ou de outra nos finais de semana, se falam por telefone, trocam mensagens pelo Orkut. Mas esse episódio foi uma grande lição. Para as crianças e para os adultos.
A outra história aconteceu com um menino de 10 anos, bastante querido pela turma. Por alguma razão, ele se esforça para ser identificado como um bom camarada. Comete atos de generosidade exagerada. Está sempre dando algum presente a alguém. Brinquedos caros, balas, figurinhas disputadas etc. Faz tudo o que lhe pedem. Em troca de afeto, talvez? Um dia desses o "gente boa" deu a senha de seu perfil no Orkut a uma colega de sala.
O que aconteceu? A menina se fez passar por ele e enviou xingamentos a várias colegas. Soltou o verbo e o veneno. "Você é feia", "não quero namorar você", "fulano não gosta de você", etc. Foi uma confusão. Todas as meninas se voltaram contra ele. As mães das garotas foram tirar satisfação com a mãe do menino. Até essa mulher conseguir entender o que aconteceu e provar às outras que ele não era ele, muito sofrimento rolou.
Esses e outros episódios me levam a crer que a garotada que sabe tudo de internet está completamente perdida no que diz respeito às regras de convivência nesse novo ambiente. Em habilidade tecnológica, essa geração é nota 10. Em discernimento e ética, merece zero.
Os pais e as escolas precisam enfrentar o problema. Sem rodeios. Sem fingir que é um mal menor. O primeiro passo é tentar entender a dimensão do ciberbullying. Existem poucas pesquisas sobre o assunto no Brasil. O estudo que mencionei no início desse texto foi realizado na Finlândia com 2,2 mil adolescentes entre 13 e 16 anos. Com a garantia do anonimato, eles relataram os episódios de ciberbullyig praticados nos seis meses anteriores. Nessa amostra, 7% se declararam agressores. Quase 5% relataram ser vítimas. Outros 5,4% disseram ter vivido os dois papéis (agressor e vítima).
Entre os problemas de saúde e/ou emocionais relatados pelas vítimas apareceram dores de cabeça, dores abdominais recorrentes, dificuldades de sono e sensação de insegurança na escola. Entre os agressores, verificou-se hiperatividade, problemas de conduta, dores de cabeça, abuso de cigarro e álcool etc. Todos esses problemas foram verificados entre os adolescentes que viveram os dois papéis (agressor e vítima).
Se os pais pudessem intervir precocemente, antes que as agressões se transformassem numa bola de neve, muito sofrimento poderia ser evitado. Mas como saber se a belezinha que você tem em casa é um tirano no mundo digital?
"Já conversei com pais arrasados ao descobrirem que seus filhos estavam envolvidos em investidas maldosas contra colegas de classe", diz a hebiatra Maria Dulcinea Oliveira, do Hospital Infantil Sabará, em São Paulo. O que eles podem fazer? Algumas sugestões da médica especializada no atendimento de adolescentes:
• mostrar aos jovens (ou às crianças) o impacto dos atos deles na vida do outro;
• obter informações sobre a vítima e seus pais para que, juntos, possam pedir desculpas;
• descobrir por que o agressor partiu para o ataque e ajudá-lo a rever os conceitos que tem das pessoas e do mundo;
• demonstrar interesse pelo mundo digital e, dessa forma, supervisionar de que forma o filho se comporta na internet.

É um bom começo, mas cada família precisa avaliar se está sendo capaz de transmitir aos filhos valores fundamentais como respeito, tolerância e educação. Dentro e fora da internet.

O fenômeno Bullying pode gerar malefícios irreparáveis e crimes diversos.


Na trajetória da vida nos deparamos com situações inusitadas e surpreendentes. Em algumas delas podemos agir, interferir e até mesmo remediar algo de errado, porém noutras, apenas lamentar.
Dia desses, em visita a cidade de Salvador, fui ao Mercado Modelo e ali nas suas imediações um fato ocorrido me chamou atenção para o termo inglês conhecido por Bullying, cujos atos decorrentes são antigos, mas que no presente tempo com a propagação das ações inerentes trás imensa preocupação para os educadores, pais de alunos, autoridades diversas e para a sociedade em geral, vez que os seus resultados sempre se esbarram em situações criminosas ou deprimentes, por vezes com malefícios irreparáveis principalmente para as suas vítimas.
O fenômeno Bullying é usado no sentido de identificar ações provindas dos termos zoar, gozar, tiranizar, ameaçar, intimidar, isolar, ignorar, humilhar, perseguir, ofender, agredir, ferir, discriminar e apelidar pessoas com nomes maldosos, que na grande maioria das vezes tem origem nas escolas através dos jovens alunos que assim praticam tais maldades contra determinados colegas que possuem algum defeito físico, assim como, os relacionados à crença, raça, opção sexual ou aos que carregam algo fora do normal no seu jeito de ser.
De volta ao Mercado Modelo, chegava um ônibus de turismo quando diversos vendedores ambulantes assediavam os turistas para venderem os seus produtos, quando apareceu um velho mendigo, barbudo, cabeludo, maltrapilho, imundo, de pés descalços, tipo daqueles cidadãos que vivem ou sobrevivem à espera da morte na miséria absoluta, morando debaixo das marquises das lojas ou dos viadutos que o tempo e a vida lhes deram de presente e, ao se aproximar daquele grupo de pessoas, então um dos vendedores o enxotou em verdadeira humilhação:
- Sai prá lá GAMBÁ que você espanta qualquer um com o seu fedor de fossa insuportável!...
Vendo aquela cena deprimente e desumana me aproximei daquele mendigo que já saía sem reclamar com o “rabinho entre as pernas” para lhe dar um trocado qualquer e então, do seu jeito de caminhar, dos seus gestos com as mãos, de um sinal no rosto e de um tic nervoso a piscar a todo tempo um dos olhos quase já fechado pela amargura do seu viver, o reconheci...
De imediato naveguei pelo túnel do tempo de volta ao passado e aportei em uma Escola da rede pública ali próxima na própria cidade baixa da capital baiana, no início dos anos 70, onde estudei por quase dois anos antes de voltar para Aracaju e, lá encontrei o colega de classe apelidado de GAMBÁ, então perseguido implacavelmente, ofendido na sua cidadania, discriminado pelo seu jeito de ser e humilhado incondicionalmente pela grande maioria dos seus jovens colegas, meninos e meninas com idades aproximadas de 13 e 14 anos.
Aquele jovem que talvez não gostasse de tomar banho ou que talvez não tivesse oportunidade freqüente para tanto, pelo fato de possivelmente morar em alguma invasão desprovida de saneamento básico e, que sempre chegava suado e cheirando mal em sala de aula, talvez pelo provável fato de também não possuir produtos higiênicos na sua casa, logo ganhou de algum colega gaiato o apelido de gambá que nele grudou qual uma sanguessuga a sugar a sua dignidade e, então passou a ser menosprezado e ofendido por quase todos da classe e até das salas circunvizinhas. Por onde passava os alunos tapavam o nariz e na sala de aula sentava na última carteira, isolado de todos. De tanto humilhado e discriminado que era ninguém dele se aproximava, principalmente por receio de também ser hostilizado.
Senti uma fisgada no peito ao me ver também culpado pelo que se transformou o jovem colega conhecido por gambá. Confesso ter sido cúmplice por omissão, não por ação, pois eu também era uma vítima das ações nefastas advindas do Bullying, por ser um menino tímido ao extremo ao ponto de todos os dias entrar calado e sair mudo em sala de aula, então isolado pelos colegas da classe que preferiam lidar com os mais falantes e extrovertidos.
Como vítima parceira de tais ações depreciativas, o certo era eu ter me juntado ao colega gambá, mas não o fiz por covardia, por medo, por receio de ser mais rechaçado ainda pelos demais estudantes e assim sofremos individualmente em proporções diferentes a dor do isolamento e da humilhação naquele interminável ano de 1972. No ano seguinte gambá, após ter sido reprovado com as menores notas da classe em todas as matérias possíveis não mais retornou ao Colégio, enquanto que, para minha alegria logo retornei para o meu querido Estado de Sergipe para crescer e esquecer aquele deprimente, humilhante e sufocante tempo.
Essa triste lição de vida me mostrou o quanto as chamadas inocentes brincadeiras de criança podem ser maléficas para tantos outros, se é que essas ações escolares agora conhecidas por Bullying podem ser consideradas inocentes, vez que para muitos estudiosos no assunto, tais ofensores sofrem de distúrbios psíquico que precisam de tratamento sob pena de explosões mais desastrosas ainda, como de fato vem ocorrendo em muitos lugares.
A agressividade e a violência advindas do fenômeno Bullying assumem além de tudo, o caráter etiológico do violar, não só referente às normas de conduta, a moral e a disciplina, mas principalmente viola os direitos do cidadão relacionados a sua integridade física e psíquica, a sua liberdade de opinião ou sua escolha de vida, a sua liberdade de expressão e até de locomoção, enfim, fere de morte o princípio constitucional da dignidade da pessoa humana em sociedade.
A psiquiatria e a psicologia mostram que além do sofrimento dos jovens vítimas do fenômeno Bullying, muitos adultos ainda experimentam aflições intensas advindas de uma vida estudantil traumática.
Nos últimos anos a população mundial freqüentemente assiste atônita as diversas situações estarrecedoras quase sempre nascidas e advindas do fenômeno Bullying, com agressões físicas e assassinatos por parte de alunos contra os seus próprios colegas, contra professores, guerras de gangues, de torcidas organizadas, de tráfico de drogas com participação de jovens estudantes até mesmo dentro das próprias instalações escolares.
As diversas Escolas espalhadas pelo país, destarte para as situadas nos ambientes periféricos das grandes cidades se tornaram espaço de intolerância, competições absurdas e conflitos de todos os tipos possíveis, em especial para os problemas relacionados às drogas, assim como, para os pertinentes à liberdade sexual, ou seja, para as meninas que não aderem a esse tipo de pratica livre, passando então as mesmas a sofrer diversos tipos de perseguições, em verdadeiras inversões de valores por conta das ações absurdas do fenômeno Bullying.
Ética, solidariedade e humanismo são realmente palavras desconhecidas e perdidas em muitas comunidades de jovens estudantes que as substituem pelo desrespeito e pela afronta ao direito individual do seu colega que pretende prosperar e vencer na vida honestamente, pelo seu próprio esforço e valor.
É preciso dar um basta nestes tipos perniciosos de vandalismo e delitos juvenis. O jovem necessita acima de tudo de limites. Precisa entender os seus direitos e os seus deveres e até onde eles chegam. Precisa de disciplina e autoridade. Precisa entender que todos são cidadãos em igualdade de condições. Entretanto, para que consigamos chegar a tal geração de jovens politizada, só com uma boa educação familiar e escolar é possível alcançar tal objetivo.
Assim, não há como deixar de concluir que estamos diante de um sério problema relacionado às áreas educacional, social, da psiquiatria e de segurança pública, com real tendência para sua resolução na educação preventiva, curativa psiquiatra ou psicológica, por isso, necessário se faz, da consciência absoluta do Ministério da Educação com a elaboração de verdadeiro e efetivo Programa de combate a este grande malefício conhecido por Bullying, tomando por gerentes os bons educadores, estudiosos e pesquisadores no assunto que em alguns Estados brasileiros já se fazem presentes nas suas respectivas secretarias de educação, mas que necessitam, sem sombras de dúvidas, de melhores investimentos financeiros para as suas conseqüentes vitórias que por certo serão galgadas no trabalho junto aos pais de alunos, professores e dos próprios estudantes autores e vitimas do fenômeno.
Além dessa medida, necessário se faz uma batalha mais ampla dentro do Legislativo, até com uma reforma no próprio Estatuto de Criança e do Adolescente com reais modificações e acrescentando-se a esta Lei bons artigos inerentes ao tema para possibilitar ao Estado Nação um melhor campo de atuação, pois é desejo de todos nós vermos os nossos jovens estudantes crescendo e somando-se a construção coletiva e permanente para o pleno exercício da cidadania.

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