Na nossa vida estamos cercados de pessoas que constituem o elo de nossa própria vivência – este elo se estende desde os familiares até o nosso amigo mais íntimo, o confidente, o conselheiro, o camarada da hora certa e dos momentos incertos, do abraço efusivo na hora da vitória, do cumprimento aconchegante nos instantes de tristezas, da palavra de conforto no minuto de sofrimento e nas ocasiões da perda e da dor que nos são reservadas.
Amigo é aquele cara que nas horas boas ou ruins está para o que der e vier, de ombro a ombro, festejando as alegrias e comungando para superação dos momentos difíceis do viver.
Os amigos podem ser classificados de várias maneiras: o mais chegado que o irmão, amigo de infância, amigo de colégio, amigo de faculdade, amigo de trabalho, amigo de vizinhança, amigo ideológico, amigo de farras, é o amigo que mesmo distante está presente.
Mas queremos falar do mais emblemático: o aminimigo, que é irmão siamês do amigo da onça, do amigo-urso, do amigo-peixe, o amigo que está sempre de bandeira vermelha erguida, que conduz aceso na sua mão o fósforo para jogar dentro do barril de pólvora. O chamado destruidor de prazer, o fanfarrão adepto da injúria, o pensador da maledicência, o desbocado por natureza e o deselegante no linguajar por índole.
Entre a afinidade e a inimizade existe a figura do aminimigo, que se camufla de bom amigo com um abraço sutil e de um devotamento maroto como um bote de cobra cascavel. O sorriso é fácil, o olhar é sonso, a palavra é falseada. O pior de tudo isso é que de nada desconfiamos e constamos o nome dele na relação dos melhores amigos.
Traição em dosagem dupla. De vez enquanto começamos a descobrir a engrenagem deste labirinto que nos guia para o abismo. A falsidade da verdade é difícil de ser checada à primeira vista, porém um dia a máscara cai do rosto enganador.
A vontade de vingança deste nosso falso amigo ele carrega no seu bornal de flechas venenosas, só não acerta no alvo por que a inocência prevalece sobre a malignidade dos artifícios tenebrosos. O sentimento de revolta ele traz dentro de suas entranhas e não revela a ninguém o seu desejo de massacrar e vilipendiar a benevolência.
É pura criação da maldade e do subjetivismo particular; é tão cruel a ação do aminimigo que ele ataca por puro ódio que leva no seu próprio coração. É insatisfação generalizada, é malícia desmedida, é sentimento de revolta, é ambição tresloucada, é vingança engendrada no ocultismo da maldade.
Recordamo-nos de um conto que se encaixe neste tema:
“Era lindo, muito lindo. Quando alguém soube que tinha inimigos, ele foi ouvir o sábio das montanhas, porque era horrível ter inimigos. E o sábio falou:
- Você tem inimigos porque é bonito. Os seus inimigos não perdoam a natureza que o fez assim. E, como a natureza é coisa abstrata, ficam com raiva de você (que é concreto) e se tornam seus inimigos.
O homem, então, tomou banho de vitríolo e ficou deformado e feio. Mas era inteligente e soube que tinha inimigos ainda. O velho das montanhas disse:
- Agora que é feio, eles não perdoam um homem feio e inteligente.
Ficou em silêncio para que não notassem sua inteligência. Os inimigos continuaram porque era rico (foi o que disse o velho das montanhas). E ficou pobre (o que foi muito fácil). Mas ainda tinha inimigos.
- Você era bonito, inteligente e rico, e não é mais. Mas eles não perdoam quem é tudo isso e o devolve. Eles são muitos.
Mudou-se para as montanhas. Mas tinha inimigos. O velho o alertou que eles ficaram aborrecidos, porque não tinham mais de quem pudessem ser inimigos. Ficou, então, inteligente outra vez e, quando ficou rico, tratou da feiura e ficou bonito outra vez e viveu feliz, cercado de inimigos”.
O aminimigo está muito próximo de nós mesmos e não identificamos de imediato, integra o nosso convívio, visita nosso lar, circunda as rodas de nossos outros amigos, conhece os nossos costumes, sabe até de parte de nossa intimidade, no entanto, não acredita no que é real e visível aos seus olhos, busca na mediocridade de seu próprio raciocínio o ataque impiedoso para sufocar o seu “amigo”, cujo desejo é vê-lo na fumaça escura da locomotiva na vida e pô-lo na sarjeta da primeira esquina do beco.
O passo a passo do aminimigo é difícil de ser acompanhado pelo amigo perseguido, pois, além dele saber localizar-se em ponto estratégico, as suas artimanhas são lançadas de forma oculta e seus atos são executados na clandestinidade, ou seja, na maioria das vezes, sempre na ausência do amigo perseguido.
As suas tochas de fogo são acesas com a saliva da maldade, quando o amigo inocente se prepara para a sua caminhada, os olhos do aminimigo atiçam faiscas nos gravetos da estrada que será percorrida na tentativa de atrapalhar ao ponto final da chegada.
A frase argumentativa pronunciada pelo amigo inocente, logo o aminimigo se joga contrapondo-se mesmo reconhecendo no íntimo o seu próprio erro. Quando ele não tem nenhum contra-argumento, a saída dele perante os olhares alheios é o sorriso irônico, como que se o mal engendrado de nada valeu!
O sucesso do amigo inocente ele recebe e devolve com uma praga de esconjuração apelando para o centro do ego satânico a fim de que aquela vitória venha como uma nuvem passageira.
Em contrapartida, a vida do aminimigo é levada como um saco de gatos, uma verdadeira baderna, de vez enquanto o cisco cai no seu olho, ele não sente, apenas estava avistando a trave no olho alheio.
Entretanto, na ocasião certa, quando o tiro sai pela culatra, ele acha que foi o destino que conspirou contra a sua vida, esquecendo que ele foi o feitor do cartucho e ele próprio armou a espingarda que detonou o tiro pela culatra.
A libertação do bom amigo de pureza angelical das garras deste amigo falso só encontra respaldo de defesa no escudo divinal, que afasta os malefícios e deslinda os mistérios de destruição.
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