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quarta-feira, 22 de junho de 2011

Novos moradores de cenários de crimes famosos buscam anonimato

Já há interessados em pagar R$ 800 mil pelo sítio do goleiro Bruno em MG.
Em SP, imóveis marcados por assassinatos têm novos proprietários.

Anúncio da venda do sítio do goleiro Bruno em Esmeraldas publicado em jornal da capital mineira na última semana (Foto: Reprodução)
Imóveis que foram palco de crimes que marcaram a história recente do país ficam estigmatizados e viram notícia, como é o caso do sítio do goleiro Bruno Fernandes onde Eliza Samudio teria sido vista pela última vez. Ela foi morta, segundo a Polícia Civil, no dia 10 de junho, depois de ser vista com o filho, de então cinco meses.
Segundo o advogado Francisco Simim, que defende a ex-mulher do goleiro Bruno, Dayanne Souza, o sítio do atleta, localizado no Condomínio Turmalina, em Esmeraldas, Região Metropolitana de Belo Horizonte, está à venda por R$ 800 mil e já tem interessados.
“Recebi telefonemas de pessoas curiosas, mas há apenas este interessado de fato em comprar o sítio”, disse Simin, afirmando que esta é a primeira proposta formal que recebeu desde que colocou nos jornais anúncio para a venda.
Fachada do Edifício Londron, na Zona Norte de São Paulo, onde Isabella Nardoni foi morta (Foto: Bruno Azevedo/G1)
Em São Paulo, diferentemente do que ocorreu com o sítio do goleiro Bruno, não está fácil para os pais de Alexandre Nardoni venderem o apartamento de onde a pequena Isabella, de 4 anos, foi atirada do 6º andar em 2008. Segundo moradores e porteiros do Edifício London, onde o crime ocorreu, o apartamento número 62 continua vazio, apesar de a família Nardoni ter baixado o preço para venda. O imóvel, na Zona Norte de São Paulo, estaria avaliado em mais de R$ 250 mil, mas a família estaria pedindo R$ 150 mil.
Segundo o porteiro, outro apartamento da família também no 6º andar, que pertencia à irmã de Alexandre Nardoni, foi vendido em 2009 e “tem gente morando”. Alexandre Nardoni, e a mulher, Anna Carolina Jatobá, foram condenados em março de 2010 pela morte de Isabella e estão presos.
O G1 tentou contato por telefone com proprietário do imóvel, o advogado Antonio Nardoni, pai de Alexandre, e deixou recado várias vezes na caixa-postal, mas ele não retornou. O advogado do casal condenado, Roberto Podval, diz que não se manifesta sobre o assunto porque “se trata de questões pessoais da família, só trato da parte jurídica”.
O G1 também percorreu outros locais que foram cenários de crimes que viraram manchete. Em muitos imóveis em que já há novos moradores ou donos, eles evitam falar com a imprensa e buscam o anonimato.
Um sequestro de mais de 100 horas
Apartamento onde Eloá foi mantida refém está ocupado por família carente (Foto: Arquivo/Agência O Globo)
O palco de um dos sequestros mais dramáticos da história do país tem novos moradores há dois anos. O apartamento onde a estudante Eloá Cristina Pimentel, de 15 anos, foi mantida refém por mais de 100 horas antes de ser assassinada pelo namorado, Lindemberg Fernandes, é habitado por uma família carente, que está adquirindo o imóvel da Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU).
“Meu barraco caiu com a chuva aqui em Santo André dias antes do desfecho do caso, eu acompanhei tudo pela TV de uma creche onde minha família ficou abrigada. Depois a CDHU nos ofereceu este apartamento, porque ninguém queria, e desde então estamos aqui”, diz a dona de casa Daniela Cristina de Souza, de 27 anos, que mora no apartamento 24 da CDHU Jardim Santo André com um filho de 7 anos e o marido.
“Eu não tenho medo de ficar aqui. Muitas pessoas não quiseram porque aqui houve algo trágico, mas, como eu não tinha onde morar, aceitei. Deus nos protege”, afirma ela, que diz que evita a exposição à imprensa.
Em nota, a CDHU informou que “o apartamento onde ocorreu o incidente ficou preservado para perícia policial. Após liberação, foi reformado e recomercializado para uma família originária de área de risco do Jardim Santo André, que o aceitou prontamente. Essa família reside no local até hoje”.
Casa de PC Farias vira ponto turístico
A casa em que Paulo César Farias foi encontrado morto com a namorada Suzana Marcolino, em junho de 1996, na Praia de Guaxuma, em Maceió, virou ponto turístico na capital alagoana. O imóvel fica grande parte do tempo fechado, mas, segundo o advogado da família, está sob os cuidados do filho de PC Farias.
“A casa continua com a família, e está com o filho de Paulo César. O imóvel é usado com frequência, só não sei se há alguém morando lá”, diz o advogado José Fragoso Cavalcante, que representa a família.
O terreno vizinho ao de PC Farias foi incorporado recentemente por uma construtora, mas ainda não há informações sobre o que funcionará no local. Já a mansão de PC Farias, em Maceió, que também pertence à família, está alugada e hoje funciona como casa de eventos.
PC Farias e Suzana foram encontrados mortos, com um tiro cada um, deitados na cama da casa de praia de Paulo César, em junho de 1996. O caso permanece sem solução.
Mistério de 23 anos
Segurança da Rua Cuba, Fidelcino Alves da Silva diz que local ficou marcado pelo assassinato (Foto: Tahiane Stochero/G1)
Há 23 anos, a Rua Cuba, endereço de mansões nos Jardins, na Zona Sul de São Paulo, tornou-se cenário de um crime que chocou o país e até hoje é um mistério. O advogado Jorge Toufic Bouchabki e sua mulher, Maria Cecília, foram assassinados a tiros em casa às vésperas do Natal de 1988. O filho deles, de 19 anos na época, era o principal suspeito da polícia, mas sua culpa nunca foi provada e o crime prescreveu.
“Esta rua ficou marcada para sempre por um mistério que ninguém tem resposta. Ninguém sabe quem matou o Jorge e a Cecília. A casa deles ficou um tempo vazia, depois foi alugada por 10 anos e acabou sendo vendida em 2008 para uma família que é bem reservada”, diz Fidelcino Alves da Silva, de 74 anos, que há 30 anos é segurança da rua.
Na casa do crime, os proprietários disseram pelo interfone que não queriam falar sobre o assunto.
“Eu conhecia a família, tomava café com eles. O menino, o filho deles que era suspeito, às vezes passa por aqui na rua. Ele mora perto, não tem porque sumir”, diz Silva, que na época prestou depoimento à polícia para descrever se havia visto algum suspeito na rua no dia do assasssinato.
A mansão dos Rugai
Mansão onde o casal Rugai foi assassinado em 2004 agora abriga uma empresa de publicidade (Foto: Tahiane Stochero/G1)
A mansão em que o publicitário Luiz Carlos Rugai, de 40 anos, e a mulher, Alessandra Troitino, de 33 anos, foram mortos a tiros em março de 2004 também tem novos donos, segundo relataram ao G1 moradores da Ra Atibaia, em Perdizes, onde o crime ocorreu. O filho de Rugai, Gil, que já esteve preso acusado pelas mortes, diz que desconhece a venda e que o imóvel é administrado pelo irmão. “Eu não faço mais parte do inventário”, disse ao telefone.
Atualmente, o imóvel está sob propriedade da OutLet Marketing, empresa de publicidade e comunicação. O G1 tentou falar com os diretores da empresa no local e também por telefone e os atendentes dizem que a empresa não se manifesta sobre o tema. O advogado de Gil, Fernando José da Costa, também não respondeu aos recados da reportagem.
Gil Rugai disse ao G1 que atualmente mora com a avó Conceição em São Paulo. Ela afimrou que sabia que a casa estava à venda. “Tinha um corretor cuidando disso, mas não sei como anda”, disse.
Gil Rugai chegou a ficar preso entre 2004 e 2006, mas foi colocado em liberdade pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Em fevereiro do ano passado, o STF considerou legais as provas técnicas contra o suspeito. A Justiça decidiu em 2009 que ele deve ir a júri popular, mas a data não foi marcada.
Prédio onde o coronel Ubiratan, que comandou a invasão ao Carandiru, foi encontrado morto (Foto: Tahiane Stochero/G1)
Outro imóvel famoso por ter se tornado cenário de crime que agora está habitado é o apartamento no Centro de São Paulo onde foi morto em 2006 o coronel Ubiratan Guimarães, conhecido por ter comandado a invasão à Penitenciária do Carandiru em 1992, que terminou com 111 presos mortos. A namorada do oficial, a advogada Carla Cepollina, foi apontada pela polícia como a principal suspeita de ter atirado contra ele enquanto dormia. Em junho de 2010, o Tribunal de Justiça decidiu que ela irá a júri popular pelo crime, mas a data não foi marcada.
O porteiro do prédio onde o crime ocorreu, localizado na Rua José Maria Lisboa, diz que o apartamento foi vendido, mas não soube dizer se os novos moradores são parentes da família. A corretora Neide Lins, da imobilária Venditum, e que possui um apartamento para alugar no edifício, diz que nunca teve problemas para arrumar moradores para o prédio e que não houve desvalorização. “O apartamento que temos para alugar é de dois dormitórios e está por R$ 1.800 por mês. Nunca houve problemas nenhum para locar ali, porque a localização é boa”, afirmou Neide.
A Itambé, administradora do condomínio, informou através da assessoria de imprensa que “na época, as pessoas ficaram impressionadas com o caso, mas não percebemos nada significativo em termos de desvalorização do imóvel” e que não tem permissão para disponibilizar os nomes dos proprietários do imóvel.
Salvador
O porteiro do Edifício Catarina Paraguaçu, na Graça, bairro de classe média alta em Salvador, fala baixinho, demonstrando receio em dar informações. O apartamento 402 foi palco de uma tragédia em 21 abril de 2002. O psiquiatra Breno Mário Mascarenhas de Castro, então com 42 anos, deu vários tiros de revólver no pai, o advogado e professor aposentado da Universidade Federal da Bahia, Auto José de Castro, de 78 anos.
O professor Auto tinha ido com um amigo da família, Diógenes Santos Lopes, ao apartamento do filho, que morava sozinho, para tentar convencê-lo a se internar para tratar problemas psiquiátricos. Breno Mascarenhas, que também era professor, tinha sido flagrado várias vezes armado nas salas de aula.
Os dois, pai e filho, viviam, segundo relato de parentes ao longo do processo, uma relação tensa e de conflito. Várias vezes o pai tentou internar Breno. No depoimento à polícia, no dia do crime, Breno disse que o pai o chamava o tempo todo de “desequilibrado e impotente. Meu pai civil e biológico era meu inimigo pessoal e social… Foi responsável por minha ruína moral e social.”
Breno atirou no pai quatro vezes. E um dos tiros atingiu também o amigo Diógenes que, mesmo ferido na barriga, conseguiu sair do apartamento e chamar a polícia. Breno permitiu que a polícia entrasse no apartamento para socorrer o pai, mas se trancou num quarto e só saiu depois de uma longa negociação. Em novembro de 2003, a Justiça condenou Breno Mário, por seis votos a um, a oito anos de reclusão em regime semiaberto.
A pena deveria ter sido cumprida na Colônia Penal Lafeyete Coutinho. Mas Breno ficou 4 anos internado no Hospital de Tratamento e Custódia do Estado da Bahia. No dia 14 de julho de 2006, a Justiça determinou o livramento condicional do psiquiatra.
O porteiro do edifício olha para os lados, pensa como responder, mas esclarece: o apartamento 402 está alugado. Ele não sabe se a família que mora lá agora sabe do que ocorreu no apartamento. E também não diz como a família é constituída. Se é um casal, se tem filhos. Também não aceita interfonar para os moradores. “Se eles ainda não sabem, não é agora que vão ficar sabendo”. E encerra a conversa.
Breno está morando em outro apartamento no Corredor da Vitória, uma área bem próxima da Graça e com padrão classe A.

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