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quarta-feira, 25 de agosto de 2010

Da Restrição Ao Direito À Intimidade Do Preso


O objetivo desta pesquisa é apresentar idéias, além de discutir sobre a visita íntima ao preso; se realmente é um direito conquistado por eles ou um privilégio concedido aos internados e também apontar problemas gravíssimos que ocorrem dentro das penitenciárias, devido a este tão discutido, tipo de visita.

Dentre os principais princípios constitucionais, existem o da dignidade da pessoa humana e o de que ninguém será submetido a tratamento desumano ou degradante. A Carta Magna também adota, entre as penas previstas, a privação ou restrição da liberdade e a suspensão ou interdição de direitos. A Lei de Execução Penal tem por objetivo proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do internado, sendo que a eles são assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei. Ao se refletir sobre estes aspectos, surge a questão da visita íntima ao preso.

As mulheres aprisionadas não desfrutam da regalia, em sua totalidade; é limitado o exercício desse “direito” devido aos diversos problemas que elas enfrentam. O principal deles é que não existe lei específica que regulamente o assunto. De tal sorte, o Ministro da Justiça, Tarso Genro, no uso das atribuições que lhe são conferidas por lei, regulamentou a visita íntima no interior das penitenciárias federais [1]. As unidades estaduais não estão sujeitas a essa regra. Ora, havendo a permissão de algo complexo e sem regulamentação, geram debates pertinentes na seara jurídica, no que tange ao (des) cumprimento de preceitos fundamentais da Constituição Federal.



MATERIAIS E MÉTODOS



O estudo foi realizado através de doutrinas, jornais, artigos, documentos eletrônicos, entre outras fontes de informações. Aconteceram três entrevistas: com o Dr. Paulo Henrique da Silva Carvalho – Delegado de Polícia Titular de São Paulo, Diretor da Cadeia Pública Feminina de São Pedro do Turvo/SP e Professor de Direito Penal, com a Dra. Joana Tonetti Biazus – Juíza de Direito do Estado do Paraná e Mestra em Ciência Jurídica e com o Dr. Jorge Luís de Camargo – Procurador Federal e Professor de Direito Constitucional. Estes passaram conhecimentos teóricos e práticos sobre a questão discutida, que, como juristas no exercício de suas profissões, já estiveram direta ou indiretamente ligadas ao assunto.



DISCUSSÕES E RESULTADOS



Os direitos dos presos estão previstos, em numerus apertus, na Seção II da Lei de Execução Penal – Lei 7.210/84. O art. 41, X, desta mesma lei, garante aos aprisionados o direito à visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados. Porém, não se trata da visita íntima.

Devido à falta de lei especial, alguns Diretores de Estabelecimentos Prisionais acabam não permitindo a visita íntima aos internos e segundo o Delegado de Polícia e Professor de Direito Penal, Dr. Paulo Henrique da Silva Carvalho, isso não viola a Constituição Federal:



Eu acredito que embora seja natural a relação sexual em si, nós não podemos falar que o fato de uma pessoa deixar de poder praticar o ato sexual dentro do regramento de uma cadeia, pode ser considerado desumano ou degradante (...) a partir do momento que a pessoa comete um crime, ela está escolhendo o lado errado e ali na prisão existem regras pré-estabelecidas: Olha aqui não se deve praticar o ato sexual por conta de várias conseqüências que poderão ocorrer. (...) o preso provisório ou condenado perde o direito de votar suspensão ou interdição de direitos e por que ele tem direito a manter sexo com sua parceira ou parceiro?[2]



A finalidade da visita, na teoria, é de fortalecer as relações familiares, aproximar a vida do prisioneiro àquela que tinha em sua liberdade, em busca de uma ressocialização, que é um dos objetivos da pena. Na prática, é também para controlar o dia-a-dia da unidade prisional que não é nada simples. Sob esses aspectos, a Juíza de Direito e Mestra em Ciência Jurídica, Dra. Joana Tonetti Biazus, defende:



Eu sei que no Estado do Paraná é possível e usual a visita íntima nas Penitenciárias, havendo inclusive um "respeito" entre os presos quando esta visita ocorre. Entendo que a visita íntima deve ser permitida por ser apenas o exercício de uma atividade sexual normal do ser humano, tratando-se de uma necessidade física indispensável. Saliento que na Cadeia Pública de uma das Comarcas que trabalhei, o Delegado admitia a visita íntima da mulher ou companheira, pois entendia que isso tornava o ambiente na cadeia mais ameno, tranqüilo e menos hostil[3].



Os Diretores dos Estabelecimentos baixam portarias, onde existem regras necessárias para a manutenção da instituição e convivência dos internos. Nelas estão presentes as faltas graves, que podem restringir direitos do preso caso ele venha cometê-las. Constam também a permissão ou não da visita íntima.



DESENVOLVIMENTO



Nos dias de visita íntima, normalmente no primeiro ou no último sábado do mês, existem filas nas unidades prisionais masculinas. São várias as mulheres que de forma constrangedora, encontram-se com seus parceiros, dando a eles todo carinho e amor. Já nas unidades femininas é bem diferente; são poucos os homens que visitam suas parceiras detentas. A maioria das visitas é dos pais, filhos e irmãos.

De acordo com Márcia de Lima (2006, p. 18) existe uma grande diferença entre homens e mulheres aprisionados:



A visita íntima só pode ser feita em dias e horários pré-estabelecidos, como na Penitenciária Feminina da Capital de São Paulo, onde é somente permitida uma vez por mês, num período de duas horas, e dependente da união conjugal prévia, de casamento ou de vínculo marital comprovado. (...) para homens presos, a visita íntima possibilita mais encontros e com diferentes parceiras, porque não discrimina tipos de vínculo.



Embora exista a dificuldade da visita do parceiro à detenta, grande parte das internas deseja outros tipos de direitos e não a visita íntima propriamente dita. Muitos que eram companheiros das presidiárias enquanto estavam em liberdade, sequer vão ao presídio. Numa pesquisa realizada por Márcia na mesma penitenciária supracitada, dentre 654 internas pesquisadas, apenas 23 inscreveram os parceiros para a visita íntima. Uma das detentas que não optou pela visita íntima, relatou o seguinte:



A visita íntima é estressante, você briga com o marido numa semana e aí na outra já é o dia da visita e você é obrigada a ter relação com ele só porque é o dia da visita... (...) O meu psicológico não permite a visita íntima porque quando eu fazia era só pra satisfazer a ele...[4]



Outra restrição enfrentada pelas detentas, segundo elas, é o da possibilidade de engravidar dentro da prisão. Não é o lugar ideal para se criar uma criança. É um dos motivos pelo qual é proibida a visita íntima na maioria dos presídios femininos.

Embora as resoluções e portarias que regulamentam as visitas íntimas, expressem que as mesmas ocorrerão em local adequado para esta finalidade, proibindo-as em celas de convivências dos presos, não condiz com a realidade. Estas celas são utilizadas muitas vezes para a intimidade, onde colocam uma cortina “separando-os” dos demais, ligam o som baixinho e praticam o ato sexual.

No Direito Constitucional e no Direito Penal existe o princípio da legalidade “não há pena sem prévia cominação legal” a ser obedecido. Sobre o tema em questão, o Procurador Federal e Professor de Direito Constitucional, Dr. Jorge Luís de Camargo ensina:



- Os tipos penais incriminadores descrevem, dentre outras, a pena privativa da liberdade; - A interpretação deve ser restritiva, pois estamos falando em matéria de direito penal; - Se a interpretação é restritiva e o Estado somente pode privar do indivíduo aquilo que estiver anteriormente previsto em lei, presume-se que as demais liberdades, além da de locomoção, sejam mantidas ao preso, tais como: a de comunicar-se com terceiros, receber visitas, estudar via internet, trabalhar dentro do presídio, ver televisão, manter relações sexuais, etc.[5]

Essa regalia já trouxe sérios problemas às instituições prisionais. Adolescentes já foram exploradas sexualmente dentro dos presídios, através da visita íntima. De acordo com artigos e reportagens, moças também venderam o corpo para “honrar dívidas de drogas e acabaram virando escravas dos traficantes presos” (O JORNAL, 2003, grifo nosso). Um presidiário que, durante a visita íntima, assassinou a sua namorada asfixiada devido a um desentendimento pessoal (BANDNEWS, 2008).

A reportagem “Mordomias em carceragem no Rio” (FANTÁSTICO, 2007) mostra o poder de mando numa determinada cadeia do Rio de Janeiro, onde a visita íntima, para o preso comum, era comercializada por R$ 50,00 a cada hora. Situações estas que a sociedade observa e que só resta lamentar ou quem sabe lutar para melhorar.



CONCLUSÃO



Ante o exposto, conclui-se que se fosse adotado o direito positivo, o aprisionado não teria tantos direitos a desfrutar, tão pouco a visita íntima. Seria de forma mais rígida, como em muitos presídios dos EUA, onde abandonaram a idéia de ressocialização dos presos. Estes não têm contato pessoal nem com seus advogados, que se vêem através de um vidro e se falam por um fone.

Respeitando os direitos humanos e o princípio da dignidade, a visita íntima ao preso deve ser regulamentada em nosso país porque ela já existe. Deverá abranger condições especiais para tal, como por exemplo, o local da visita, dentre outras.

É preciso fazer cumprir o princípio da isonomia que diz que “todos são iguais perante a lei” e, portanto, extinguir a desigualdade no que tange às mulheres detentas. Estas também devem ter o direito a essa visita, em sua totalidade, desde que o Estado, nos casos de gravidez, garanta a assistência médica e social desde a gestação até o nascimento da criança e durante a amamentação, período em que a lei permite a mãe estar com o filho no estabelecimento prisional, assegurando o direito à vida.

Tentar sempre que possível igualar a vida dentro e fora da prisão, para que o preso possa retornar muito melhor à sociedade. Deverá conceder a ele também os direitos que não foram atingidos pela sentença condenatória (ver televisão, ouvir rádios, ler livros, receber a família com mais freqüência etc.). Se houver abusos no exercício desses direitos, caberá ao Estado intervir em favor da coletividade. São idéias e soluções para tentar mudar o mundo carcerário. Se nada melhorou ainda é porque nunca existiram tentativas para que isso acontecesse.



FONTES



BRASIL, Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil: promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: . Acesso em: 07 Agosto 2008.



BANDNEWS. Preso mata namorada durante visita íntima. Disponível em: < http://br.truveo.com/Preso-mata-namorada-durante-visita-íntima-em/id/4191042465>. Acesso em 15 Julho 2008.



FANTÁSTICO. Mordomias em carceragem no Rio. Edição de 11/11/2007. Disponível em: . Acesso em 18 Julho 2008.



MISCIASCI, Elizabeth. Visita íntima para mulheres encarceradas. Eles são dotadas de insensibilidade.. Elas se deparam com o constrangimento. Disponível em: . Acesso 03 Agosto 2008.



O JORNAL - Vida - Liberdade - Solidariedade. “Visitas Íntimas” nos presídios servem para prostituir menores. Disponível em: . Acesso em 25 Julho 2008.





REFERÊNCIAS



CAPEZ, Fernando. Execução Penal. 12ª ed., São Paulo: Damásio de Jesus, 2006.



LÉVY-BRUHL, Henri. Sociologia do Direito. Trad. Antonio de Pádua Danesi. 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1997.



LIMA, Márcia de. Da visita íntima à intimidade da visita: a mulher no sistema prisional. Dissertação (Mestrado em Saúde Pública) – Faculdade de Saúde Pública, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2006.



MORAES, Alexandre de. Direito Constitucional. 15ª ed., São Paulo: Atlas, 2004.



NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de processo e execução penal. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005.



[1] Através da Portaria Nº. 1.190, de 19.06.2008: MJ.



[2] Dados da entrevista. A Visita Íntima nos Presídios. Realizada no Plantão Policial Permanente de Ourinhos/SP em 30/07/2008, grifos nossos.

[3] Dados da entrevista. A Visita Íntima nos Presídios. Realizada nas Faculdades Integradas de Ourinhos/SP em

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